Ontem a nostalgia me tomou. Tanto
que de noite sonhei que estava lá na minha Luanda, Angola e me vi novamente na
infância e adolescência, deu saudade. Mas como quem vive de passado é museu não
fiquei triste não. Nunca me arrependo do passado ou sinto que nada valeu nada.
Corri muito, andei de bicicleta pela cidade toda, jogava bola e no sonho vi a
praça da nossa Rua Ferreira do Amaral onde eu sentava com os colegas brincando
e jogando conversa fora. Ali aprendi a me defender, aprendi a sentir atração,
aprendi a não entrar na droga, já naquela época havia um colega que usava
maconha. Depois vi a primeira morte pela guerra ali mesmo. O passado não nos
serve para sentirmos saudades, serve para nele voltarmos e entendermos o que cada
coisa nos formou, nos moldou.
Quando cheguei ao Brasil com 13
anos estava traumatizado pela guerra civil, era um adolescente fechado, que
havia perdido tudo, principalmente havia deixado para trás o seu cãopanheiro,
um lindo e jovem pastor alemão, estávamos sem dinheiro para nós, quanto mais
levar um cachorro para outro país. Logo
aqui conheci uma bela italiana que me fez sentir homem pela primeira vez, foi o
meu primeiro beijo, primeiras fantasias, amor. Pelos destinos não deu certo,
mas ainda mora no meu coração, um espírito que vai me acompanhar na jornada com
certeza.
Fiz universidade, trabalhei como
peão batendo marreta, cortando chapa, soldando, montei e desmontei motores. Mudei
meu curso várias vezes em busca de aprendizagem e hoje vejo o quanto isso foi
útil. Não parei no tempo. Alguns se admiram com a minha vida por aqui, quantas
coisas, piloto, patinador, paraquedista, jogador de hóquei, futebol americano, guerrilheiro,
gerente industrial, peão, dono de empresa de táxi aéreo, roubado por
narcotraficantes, desemprego e tendo de vender as coisas no quintal, tive um
AVC que me assustou, tive problemas graves de convívio com a minha mãe e a
minha esposa, quantas coisas. Casado, divorciado, casado de novo à 19 anos,
pelo menos posso dizer que aproveitei a vida ao máximo. Vejo pessoas fazendo o
mesmo anos e anos e ao sentirem que o tempo por aqui está acabando se
arrependem de não terem aproveitado. Cada vez que chegamos aqui temos a missão
de evoluirmos, de aprendermos para ao irmos embora podermos melhorar a nossa
posição nos degraus da nossa jornada eterna, ou vocês acham que esta vida
curtinha é só?
Como aprendi a amar, a não dar
importância a coisas bobas, a escutar e entender que os outros são irmãos e com
os mesmos problemas e desejos que eu, buscando ajuda e ajudar como eu.
Respeito, amor, entendimento, energia positiva, isto que aprendi com o meu
passado e, às vezes, é bom voltar a ele para relembrar lições. E principalmente,
passar adiante essas lições, ajudar os outros com as minhas experiências.
Às vezes me fecho no meu mundo,
gosto de meditar, ficar sozinho, mas porque quero me sentir, pensar na minha
jornada, me lembrar do que sou e porque eu estou aqui...
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